sexta-feira, 16 de outubro de 2009

Os Personagens

As duas figuras centrais na história de Cervantes surgem na obra com um contraste espantoso: o cavaleiro da triste figura, como D. Quixote a si próprio chamou, magro e alto, aprumado no seu pangaré e o seu inseparável valet, o pequenino e roliço Sancho, que se tornaram na sociedade de então os símbolos da amizade e a bandeira do convívio entre a fantasia e a realidade.

Após a publicação da obra em 1605, começou a verificar-se uma enorme influência das personagens sobre a sociedade europeia, chegando mesmo a existirem registos de um nobre português que se apresentou numa festa em Valhadolide vestido de Dom Quixote e montado num cavalo, fazendo-se acompanhar por um escudeiro que só podia ser Sancho Pança.

A partir desta altura são inúmeros os registos em toda a Europa de outras manifestações, em que é bem visível a influência da obra, começando a multiplicar-se as várias edições em várias línguas, assim como a presença das personagem nas festas das cortes espanholas e europeias.

As palavras de Sancho Pança tornam-se por demais verdadeiras: “ (..) que antes de muito tempo não há-de haver albergaria, nem estalagem, nem, tenda de barbeiro por onde não ande pintada a história das nossas façanhas”.



Os estudiosos da obra de Cervantes referem como pontos essenciais presentes no seu trabalho, a profunda critica à sociedade da época e a diversão associada à mesma, procurando divertir, talvez a primeira das reacções que Cervantes procurava. Exemplo desta afirmação encontra-se no seguinte: “esta Dulcineia del Toboso, tantas vezes nesta história referida, dizem que teve melhor mão para salgar porcos que outra mulher alguma de toda a mancha”.

As caricaturas do séc. XVII e XVIII pegam sempre em D. Quixote como tipo caracterizador do ridículo e do grotesco, carente de sentido, provocador de riso, na sua demência guerreira. A partir do séc. XVIII e XIX começam a surgir outras interpretações: a justiça, a fidelidade amorosa, a nobreza, serão alguns elementos constitutivos desses ideais. Estas vertentes sobrevivem até aos nossos dias e fizeram com que o nosso protagonista surja umas vezes como herói outras como louco.

A obra é muito espanhola pelo realismo das cenas que descreve, pelos tipos genuinamente nacionais que apresenta, pelas figuras que faz mover.

No seu livro todos os que o lêem podem identificar-se com as personagens e suas aventuras, permitindo que cada geração o cunhe e o interprete à sua imagem, atribuindo-lhe ideias novas que não pertenceram ao tempo em que o autor viveu e que concerteza o espantariam.

D. Quixote lutou contra gigantes e feiticeiros e exércitos inimigos criados pela sua imaginação. Os leitores têm vindo a criar dentro dele tristezas, pensamentos, reacções contra a chata realidade das coisas que nunca existiram senão na mente dos críticos que a pouco e pouco foram juntando à bagagem de D. Quixote mais esses apêndices.

De facto, por mais exactas que sejam as descrições de Cervantes a respeito das figuras centrais da história, muitos são os pormenores deixados à liberdade de imaginação do leitor. Exemplo desta ideia temos a figura que nos surgiu imediatamente de D. Quixote, a imagem de um cavaleiro magro com uma bacia de barbeiro na cabeça e montado num cavalo todo ele pele e ossos, pileca alongada e estendida, tão descarnado e tão magro, tão tísico “(…) que mostrava bem a descoberto quão avisada e propriamente lhe fora posto o nome de Rocinante (…)”.

”A idade do nosso fidalgo rasava os cinquenta anos. Era de compleição rija, seco de carnes, enxuto de rosto (…). E o que primeiro fez foi limpar umas armas que haviam sido dos seus bisavós, que, cobertas de ferrugem e cheias de mofo, estavam havia longos séculos postas e esquecidas a um canto. Limpou-as e reparou-as o melhor que pôde (…) “.

D. Quixote tem inspirado milhares de livros, contos, novelas. No entanto a sua personagem central tem conseguido resistir à acção do tempo, surgindo como vencedora no confronto com gigantes e monstros, animando a nossa imaginação.



Um comentário:

  1. João
    Oi estou passando o e-mail para dizer que a edição do caderno de natal vinculará no dia 17/11 e saber se o Sebo Dom Quixote participará conosco , como sempre.
    O teu módulo colorido sai R$ 75,00 .
    grato
    Luiz Renato Barboza

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